Cheguei ao Rio de Janeiro pouco depois das 22h e a primeira providência foi pedir algo pra jantar. Estava cansada demais até mesmo para ir a algum dos barzinhos da rua. Só queria comer e dormir. 

Tomei banho enquanto esperava o lanche e depois de comer, me joguei na cama. Mesmo com todos os apelos do corpo, não consegui dormir tão rápido como gostaria por causa do barulho da água que pingava do ar-condicionado do quarto acima do meu e batia na estrutura de alumínio que protegia o equipamento do meu quarto. 

Na companhia do insistente incômodo causado pelo pec-pec, adormeci, mas não sem visualizar o diálogo que teria com o pessoal do hotel na manhã seguinte: preciso de um quarto no 11º e último andar do prédio. Estava no nono e não poderia correr o risco de passar as noites seguintes sofrendo da mesma maneira.

Se por um acaso você ainda não percebeu, observe o poder de definir as intenções do dia seguinte antes de dormir. Sugiro que faça esse exercício porque ele é capaz de determinar o humor que orientará seu dia. 

Como uma boa madrugadora e já com o relógio biológico acostumado ao horário das 5h, levantei, apesar de no Rio ainda estar escuro neste horário, e abri as cortinas, como faço diariamente. Foi neste momento que o mau humor determinado na noite anterior desapareceu, junto com a intenção de mudar de quarto, porque, diante de mim, estava o Cristo Redentor, de braços abertos, ainda entre nuvens e envolto pela iluminação artificial da noite, me acolhendo e abençoando meu dia.

Sentei na cama, fiquei ali contemplando aquela imagem e pensando quantas vezes perdemos as mais variadas oportunidades porque ao invés de levantar a cabeça e observar o contexto ficamos focados apenas na gotinha que bate no alumínio e faz um barulho irritante, mas que, sim, é suportável. 

Sentei na cama e fiquei ali contemplando aquela imagem

Apesar de a meta da vida ser a materialização de nossos anseios, sabemos que a realidade se impõe e que a perfeição não existe. Então, por que resistir ao invés de seguir a orientação de Machado de Assis, de tirar o maior bem do maior mal?

Não são raras as vezes que perdemos a chance de vivenciar experiências transformadoras porque algum detalhe não está como o idealizado. Assim, não fazemos concessões. Não conversamos com as pessoas. Perdemos a conexão com a gente mesmo e com o outro porque as coisas não estão como gostaríamos. Descartamos oportunidades, pessoas, a nós mesmos. 

Naquele momento, diante do Cristo, eu abri mão do silêncio, que é, sim, muito importante para mim, em troca de viver aquela experiência de poder dormir e acordar com Ele ali, a um piscar de olhos, literalmente. Afinal, eu não sabia se no novo quarto teria uma vista como aquela. Arrisquei, permaneci onde estava e, acredite, em nenhuma das noites seguintes tive problema com o ar-condicionado do vizinho pingando. 

A questão é, se eu não tivesse suspendido a minha descrença em noites agradáveis naquele ambiente, o que eu teria perdido? 

As chamadas crenças limitantes nos impedem de movimentos simples, porém, libertadores. As vezes precisamos apenas levantar a cabeça, ver o que está ao nosso redor e compreender que o que está sendo entregue é muito mais relevante do que poderíamos imaginar, mesmo que não seja aquilo que gostaríamos que fosse. 

Por isso, permita-se viver novas experiências, nas pequenas e nas grandes coisas do cotidiano, porque ao desviar os olhos da tela do celular para o que e quem está ao seu redor, por exemplo, há mudança de perspectiva e a percepção de uma nova realidade.