Presídio Federal de Mossoró Foto: Reprodução

Uma série de irregularidades na construção e no funcionamento da Penitenciária Federal de Mossoró foi apontada pelo Ministério Público Federal (MPF) logo após a sua inauguração, em 2009. Quem contou sobre o caso foi o procurador Fernando Rocha, em entrevista à CNN Brasil.

Em setembro de 2010, por exemplo, o procurador recomendou ao então diretor da penitenciária que os serviços de limpeza e conservação deixassem de ser realizados por detentos que cumpriam pena em regime semiaberto estadual e fossem feitos por empresa terceirizada.

Segundo a matéria da CNN, no documento, Fernando Rocha destacou que o presídio de Mossoró era o único do país no qual o serviço era realizado por detentos e não por empresa terceirizada.

“A vulnerabilidade descendente de tal rotina alcança não somente a possibilidade de facilitação de fuga dos enclausurados, como também afeta a própria segurança dos funcionários que lá desempenham suas funções”, afirmou à época.

Fernando Rocha, procurador do MPF-RN Foto: Reprodução

Três meses depois, em dezembro de 2010, o procurador apresentou uma ação civil pública na Justiça Federal visando forçar o governo federal a contratar um médico clínico geral e um psiquiatra para a penitenciária de Mossoró.

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Falta de médicos, desperdício de comida e rachaduras: o histórico da penitenciária de Mossoró

Ministério Público Federal apontou série de irregularidades na construção e no funcionamento do presídio ainda nos primeiros anos após inauguração

Presídio Federal em MossoróPresídio Federal em MossoróReprodução

Teo Curyda CNN

A fuga inédita de dois presos seguida do afastamento da direção da penitenciária federal de Mossoró (RN) é novo capítulo de uma sequência de problemas registrados no presídio de segurança máxima nos últimos anos. Uma série de irregularidades na construção e no funcionamento da penitenciária foi apontada pelo Ministério Público Federal (MPF) logo nos primeiros anos após sua inauguração, em 2009.

prisão de segurança máxima foi inaugurada em julho daquele ano. O presídio chegou a ser interditado por decisão judicial entre 2010 e 2011. A unidade é uma das cinco prisões federais que abrigam presos de alta periculosidade — em especial, líderes de facções criminosas — e a única localizada no Nordeste. As outras ficam em Brasília (DF), Catanduvas (PR), Campo Grande (MS) e Porto Velho (RO).

Em setembro de 2010, o procurador Fernando Rocha de Andrade recomendou ao então diretor da penitenciária que os serviços de limpeza e conservação deixassem de ser realizados por detentos que cumpriam pena em regime semiaberto estadual e fossem feitos por empresa terceirizada.

A recomendação foi dada depois de uma agente penitenciária ter sido feita refém por mais de 10 horas por um detento. Inspeção realizada pelo MPF um dia depois constatou que a limpeza da penitenciária era realizada, desde a inauguração, por presos do regime semiaberto estadual.

No documento, o procurador destacou que o presídio de Mossoró era o único do país no qual o serviço era realizado por detentos e não por empresa terceirizada.

“A vulnerabilidade descendente de tal rotina alcança não somente a possibilidade de facilitação de fuga dos enclausurados, como também afeta a própria segurança dos funcionários que lá desempenham suas funções”, afirmou à época.

Três meses depois, em dezembro de 2010, o procurador apresentou uma ação civil pública na Justiça Federal visando forçar o governo federal a contratar um médico clínico geral e um psiquiatra para a penitenciária de Mossoró.

Em um ano e meio de funcionamento até então, o presídio não contava com médicos em seus quadros permanentes, o que, segundo o MPF, contrariava a legislação que estabelecia a obrigatoriedade dos profissionais de saúde.

“Além de não haver o necessário acompanhamento, sendo um direito dos custodiados, inclusive regulamentado por portaria, a inexistência de tratamento médico no local traz outro grave problema, qual seja, a necessidade de deslocamento de presos supostamente doentes a hospitais da zona urbana do município de Mossoró, colocando em risco a segurança pública”, afirmou o procurador na ocasião.

Servidores que trabalhavam no presídio afirmaram ao procurador, durante as vistorias, que os detentos, sabendo que não havia setor de emergência médica, simulavam doenças para serem conduzidos a um hospital localizado a 12 quilômetros da penitenciária.

O deslocamento dos presos, conforme a ação, permitiria que quadrilhas orquestrassem tentativas de fuga, valendo-se da situação de vulnerabilidade. O MPF informou à época que, apesar de pedir informações ao Ministério da Justiça, nada foi feito de efetivo.

Interdição e transferência de Beira-Mar

No início de 2011, quatro procuradores do MPF pediram que a Justiça Federal revisse a decisão que transferiu Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, e outros cinco presos da penitenciária de Catanduvas (PR) para a penitenciária de Mossoró.

O MPF sustentou que o fato de o presídio, à época, estar interditado em virtude de problemas estruturais inviabilizaria as transferências. Foi nesta ocasião que os procuradores constataram que o presídio não possuía licença do Corpo de Bombeiros para funcionar, apresentava “graves rachaduras” nas paredes, não possuía sistema de abastecimento de água próprio e nem equipe médica permanente.

“As condições estruturais do Presídio Federal de Mossoró demonstram a impossibilidade de manter Fernandinho Beira-Mar distante das atividades criminosas, bem como de garantir os direitos inerentes à condição de apenado”, destacaram os procuradores.

Naquela época, a penitenciária tinha capacidade para 208 presos, mas abrigava apenas 38 detentos.

Meses depois, o procurador Fernando Rocha de Andrade deu início a uma investigação para apurar irregularidades na construção da penitenciária. Na ocasião, o procurador pediu que a Controladoria-Geral da União inspecionasse as instalações que o Instituto Federal do Rio Grande do Norte enviasse as conclusões sobre os problemas constatados na caixa d’água.

Ao dar início ao inquérito, o procurador pediu ainda que o Departamento Penitenciário Nacional, o Instituto Federal de Brasília e a Polícia Federal em Mossoró informassem se a construção do presídio atendeu às especificações do contrato de sua construção.

“O objetivo das providências adotadas é apurar as informações e reunir o maior composição que possam comprovar eventuais irregularidades”, afirmou o procurador.

Desperdício de alimentos

Em 2014, o MPF recomendou ao Ministério da Justiça e ao Departamento Penitenciário Nacional a adoção de medidas que evitassem o desperdício de alimentos na unidade de Mossoró.

Em média, 15 quilos de comida eram jogados no lixo por dia, o equivalente a 450 quilos por mês — cerca de 5,4 toneladas ao ano.
Levando-se em conta os 87 presos abrigados no presídio à época, esse desperdício equivalia a um prejuízo de cerca de R$ 175,3 mil ao ano.

A capacidade total do presídio é de 208 presos, mas o contrato de fornecimento das refeições previa em 167 a quantidade diária de fornecimento estimada. Considerando esse número, as perdas poderiam chegar a R$ 350,6 mil.

A recomendação foi acatada pelo presídio, que reduziu em 25% a quantidade de calorias das refeições nas penitenciárias federais. A decisão evitava não somente o desperdício de alimentos, mas também de dinheiro público.

Com isso, cada preso deixou de receber um quilo de alimento por refeição e passou a ser servido de 715 gramas no almoço e no jantar.

Um especialista em nutrição foi contratado para elaborar um cardápio que atendesse às necessidades calóricas diárias, tendo em vista os relatos de desperdício de alimentos e de aumento de peso de vários internos.

A Secretaria Nacional de Políticas Penais, responsável pelo Sistema Penitenciário Federal, foi procurada para comentar o histórico do presídio de segurança máxima de Mossoró e as medidas tomadas ao longo dos anos, mas não deu retorno até o fechamento desta reportagem.