Carlos Assis, psicólogo clínico. Foto: Cedida
Vivemos uma crise de saúde mental no Brasil, que se reflete de forma direta no mundo do trabalho. E, ao que tudo indica, os esforços do Poder Público e das empresas para frear a crise têm sido tímidos. Em 2024, o Brasil registrou quase 500 mil afastamentos do trabalho por transtornos mentais, um crescimento de 66% em relação a 2023.
No Rio Grande do Norte, essa variação foi ainda maior: 75%. O número de licenças médicas concedidas passou de 4,6 mil, em 2023, para 8,1 mil no ano passado. No ranking nacional, o estado aparece entre os dez com maior variação. Os dados são do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho e resultam em perda de produtividade, aumento de custos para as empresas e para o sistema de saúde
Apesar da gravidade, a resposta institucional no Brasil tem sido insuficiente. A Lei nº 14.831/2024 que criou o Certificado de Empresa Promotora da Saúde Mental, até hoje não foi regulamentada e segue sem efeito prático. Já a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), atualizada para incluir riscos psicossociais como assédio, estresse e sobrecarga na política de saúde e segurança do trabalho, teve sua entrada em vigor adiada para 2026. O recado transmitido foi claro: apesar dos números alarmantes, o tema não é tratado como prioridade.
Nesse contexto, os dados do Anuário Saúde Mental nas Empresas 2025, divulgado no Dia Mundial da Saúde Mental (10 de outubro), ajudam a dimensionar a distância entre discurso e prática. O índice geral de promoção bem-estar pelas grandes companhias no Brasil passou de 5,05 pontos em 2024 para 8,19 neste ano. O crescimento foi puxado pelos resultados de um pequeno grupo de empresas que, efetivamente, transformam discurso em ações concretas. No entanto, em um ranking cuja pontuação máxima é 16, isso mostra que estamos muito aquém do ideal.
Ainda existe uma cultura empresarial que enxerga incompatibilidade entre aumentar a lucratividade e promover o bem-estar, mas é possível conjugar o bem-estar dos colaboradores com o retorno para os acionistas. Estudos demonstram o impacto positivo dos investimentos em saúde mental. Análises da McKinsey apontam retorno sobre investimento de até quatro vezes para cada dólar investido, o que é ratificado pela National Safety Council / NORC (EUA).
Mas, se investir em saúde mental vale a pena, devemos entender por que ainda predomina a hesitação em ampliar ações de promoção do bem-estar. A escuta verdadeira dos colaboradores exige coragem das lideranças, que passam a lidar com a subjetividade em um mundo guiado pela objetividade. Quando se abre esse espaço, não basta coletar informações: é necessário agir a partir delas. A crise é evidente, mas também uma oportunidade. O risco é perdermos essa chance, deixando a saúde mental confinada a índices frios, leis paradas e normas adiadas.
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