Durante uma viagem por aplicativo, a conversa entre o motorista e o passageiro é quase inevitável. Entre os assuntos, um que ganhou destaque nas últimas semanas na capital potiguar: a denúncia de uma possível “indústria de multas” que estaria sendo posta em prática pelos agentes de trânsito da Secretaria de Mobilidade Urbana de Natal.
Para o motorista por aplicativo Paulo Victor, 36 anos, não é possível generalizar, porém, alguns casos acabam gerando dúvidas sobre a possibilidade da prática. “Eu presenciei uma cena que me deixou em alerta no cruzamento da Avenida Nevaldo Rocha com a Rua São José, em Lagoa Seca, enquanto trabalhava aqui no aplicativo. Agentes da STTU escondidos, como se estivessem esperando que o motorista fizesse algo de errado para aplicar a multa. Sabemos que nem todos seguem as regras, mas por que não, ao invés de esperar o erro, eles, como conhecedores das leis do trânsito, não intensificam as ações para diminuir essas infrações?”, questionou o motorista.
Assim como o motorista, outros condutores endossam a existência da irregularidade por parte dos agentes. Em entrevista ao NOVO Notícias, a secretária da STTU, Daliana Bandeira, afirmou que a pasta não atua com número de metas para aplicação de multas na capital. “Não existe uma indústria da multa em Natal. Sempre falam que os agentes recebem comissão ou porcentagem, isso não acontece. Nem tampouco há sistema de metas. Tanto faz ele aplicar três, quatro multas no expediente, como aplicar dez, quinze, vinte, o salário dele é o mesmo”, esclareceu a secretária.
Nos oito primeiros meses de 2023, Natal registrou mais de 220 mil multas. As aplicações foram realizadas pelos agentes, mas também através dos equipamentos de videomonitoramento presentes na cidade. Ao todo, R$ 27.373.041,55 foram arrecadados em autos de infração aplicados aos condutores. “Registramos 222.125 multas, sendo 96.136 infrações notificadas por agentes e 125.989 por equipamentos de fiscalização eletrônica. São 27.766 multas por mês. Se esse cálculo for feito por dia, teremos um total de 925 diárias, chegando a 38 multas por hora”, destrinchou Daliana.
De acordo com os números da STTU, a capital potiguar possui quase meio milhão de veículos para 157 agentes de mobilidade. O município conta também com o sistema de videomonitoramento, com 126 câmeras instaladas pelas vias da cidade, mas segundo a titular da pasta, o recurso não é utilizado para aplicação de multas, e sim, para monitorar o fluxo de trânsito.
Com base no sistema de infrações da STTU, entre 01 de janeiro deste ano, até o dia 1º de setembro, liderando o ranking com maior número de infrações está a de transitar na faixa ou via exclusiva para o transporte público, sendo 26.983 registros. Seguida por estacionar ao lado ou sobre canteiro central ou divisores de pista de rolamento, onde foram aplicadas 7.544 infrações. Já a infração de dirigir segurando o celular aparece em terceiro lugar, com 7.115.
Quando questionada sobre o comportamento dos agentes de trânsito, a secretária pontuou o processo de reciclagem ao qual os profissionais são submetidos. “Esse ano, mais uma vez, os agentes irão passar por atualizações e cursos, sobre as mudanças do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). E caso alguém se sinta prejudicado de alguma forma pela ação do agente, basta procurar a secretaria e registrar formalmente o caso”, afirmou Daliana.
O NOVO solicitou à Secretaria quais os locais da cidade que registram maior incidência de infrações, além de informações sobre a solicitação de recursos por parte dos condutores junto à pasta, mas os números não foram fornecidos. Segundo a Secretaria, é preciso um tempo maior para o levantamento dos dados.
Desde dezembro de 2021, a Secretaria de Mobilidade Urbana aderiu ao Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) e ao convênio com o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), resultando na adesão do Sistema de Notificação Eletrônica (SNE) desenvolvido pelo Governo Federal. Com a ferramenta, os motoristas recebem as notificações de trânsito de forma eletrônica e podem obter desconto de 20% e 40% no pagamento de multas.
Em caso de discordância, os condutores podem recorrer sobre a infração em um prazo de até 30 dias. O processo passa pela Junta Administrativa de Recursos de Infrações (JARI) para avaliação de deferimento. Daliana reforça que é preciso “o condutor refletir se está agindo de maneira correta no trânsito”, assim, os números de infrações sofreram uma queda, e em consequência, a aplicação das multas.
Onde se aplicam os recursos das multas?
Com o valor de aproximadamente R$ 30 milhões arrecadado até agosto de 2023, a titular da STTU informou que os recursos são aplicados em melhorias estruturais da cidade e de equipamentos para os agentes. Porém, a destinação desses valores é feita pelo CONTRAN.
“Os recursos arrecadados através da fiscalização eletrônica ou do agente obedece à Resolução do Contran, nº 875 de 13 de setembro de 2021, que estabelece as formas de aplicação da receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito, que determina onde utilizar esse recurso. Ele tem uso restrito para as despesas públicas com sinalização, engenharia de tráfego, fiscalização, educação de trânsito”, explicou.
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