A lei foi batizada de Juliana Soares - Foto: Reprodução/Redes Sociais

Cotidiano

Violência Tentativa de feminicídio: caso Juliana reacende alerta sobre violência contra a mulher

RN registrou 10 feminicídios em 2025; crimes de lesão corporal dolosa contra mulheres aumentaram 7,4% no estado.

por: NOVO Notícias

Publicado 4 de agosto de 2025 às 13:36

O brutal espancamento da promotora de vendas Juliana Soares, 35 anos, ocorrido no final de julho em Natal, ganhou repercussão nacional e reabriu o debate sobre a violência contra a mulher no Rio Grande do Norte. O acusado, Igor Cabral, foi autuado por tentativa de feminicídio, após desferir mais de 60 socos na cabeça da ex-namorada. O caso levanta questões cruciais: o que caracteriza uma tentativa de feminicídio? Como denunciar? E por que tantas mulheres ainda sofrem caladas?

Segundo a delegada Helena de Paula, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) de Parnamirim, a tentativa de feminicídio é identificada quando há “animus necandi”, ou seja, a intenção clara de matar. “No contexto em que os fatos ocorreram, caso demonstrado que o agressor tinha a vontade livre e consciente de matar sua namorada, desferindo contra ela 61 socos na cabeça, o que somente não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, ele será enquadrado no feminicídio tentado e será julgado perante o Tribunal do Júri”, explica.

A delegada reforça que o feminicídio tentado se diferencia de outras agressões, como ameaça ou lesão corporal, pela presença dessa intenção de matar, ainda que o crime não tenha sido consumado.

O episódio gerou uma onda de comoção e trouxe impactos diretos. Segundo a delegada, houve aumento na procura por ajuda nos dias seguintes ao crime, reflexo da maior visibilidade e circulação de informações sobre os canais de denúncia e os sinais de violência doméstica. “Essa repercussão contribui para que mais mulheres se sintam encorajadas a buscar apoio”, afirma.

As denúncias podem ser feitas em qualquer delegacia de polícia ou por meio das 12 DEAMs espalhadas pelo estado. Também é possível denunciar pelos telefones 181 (Polícia Civil) e 180 (Ministério dos Direitos Humanos), ou ainda pela Delegacia Virtual da Mulher, onde é possível solicitar medidas protetivas de urgência.

Apesar dos avanços na rede de apoio, a subnotificação ainda é uma barreira. O medo do agressor, a dependência emocional ou financeira e a descrença na efetividade da proteção judicial são fatores que inibem a denúncia. “A violência doméstica não se limita à agressão física. Muitas mulheres sofrem violência psicológica, moral, patrimonial e sexual antes de chegarem ao ponto da violência física”, pontua a delegada Helena.

Ela também rebate a percepção equivocada de que medidas protetivas só são concedidas quando há lesão corporal visível. “Hoje o Judiciário entende a complexidade do problema. A denúncia é o primeiro passo para romper o ciclo da violência.”

O caso de Juliana Soares, felizmente, não terminou em tragédia. Mas serve como um grito de alerta. A violência contra a mulher não começa com o soco — e não deve terminar em silêncio.

Dados

O Rio Grande do Norte registrou 10 feminicídios entre janeiro e julho de 2025, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Sesed). O número representa uma redução em relação ao mesmo período do ano anterior, quando foram contabilizados 12 casos.

Apesar disso, os crimes de lesão corporal dolosa contra mulheres aumentaram 7,4% no estado. De acordo com a Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análises Criminais (Coine), os registros de agressões passaram de 2.385 no primeiro semestre de 2024 para 2.562 no mesmo período de 2025.

Embora o número total de agressões tenha crescido, os casos especificamente classificados como lesão corporal dolosa em contexto de violência doméstica tiveram redução de 4,3%. Os registros caíram de 584 para 559 ocorrências. Por outro lado, os casos sem especificação de contexto aumentaram 12,7%, passando de 871 para 982.

Em 2025, a Polícia Civil abriu 31 inquéritos relacionados com tentativa de feminicídio no estado durante o primeiro semestre de 2025. As ocorrências foram distribuídas ao longo de todos os meses do período, com destaque para janeiro, quando foram abertas nove investigações.

Os crimes ocorreram em diversos municípios, entre eles Mossoró, Natal, Parnamirim, Caicó, Macaíba, Pau dos Ferros e Assu. Os casos estão sendo investigados pelas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) e por delegacias municipais.

Além disso, o Rio Grande do Norte registrou alta de 71,3% no número de tentativas de feminicídio em 2024. Os dados são do Anuário de Segurança, divulgado na semana passada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Em números absolutos, as tentativas de feminicídio saltaram de 39 casos em 2023 para 67 em 2024. O crescimento dos casos no estado foi quase quatro vezes maior que a média nacional para o mesmo crime, que ficou em 19%. A violência de forma geral também aumentou. As tentativas homicídio contra mulheres passou de 123 em 2023 para 147 em 2024.

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